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Bitcoin: Ordinals e Moedas Coloridas (Parte 1)

Por Jorge Siufi
Foto: Pixabay

A comunidade do Bitcoin entrou em um dilema com discussões calorosas desde o surgimento dos ‘ordinals’, os supostos tokens não fungíveis (NFTs) na rede Bitcoin.

Supostos, porque adiante será mostrado que ordinals não são NFTs, mas de fato isto será apenas um detalhe.

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Isto porque tais discussões calorosas não têm porque relevarem este fato, já que sua essência é a mesma.

Em sua maioria, estas discussões envolvem aficionados conhecidos como maximalistas, que expressam justificativas de certa forma mais voltadas ao sentimentalismo.

Outras discussões, de nível técnico, expõe um suposto problema na rede com os ordinal, frutos de suas próprias atualizações na blockchain.

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Se irrita uns por agora ter figurinha de macaco grafado no bloco, ou se desagrada outros por serem pesados e congestionarem a meempool, o fato é que agora os ordinals estão se proliferando dentro da rede do Bitcoin.

De fato esta característica do ordinal de armazenar dados diversos meio que não surgiu agora.

Deve ser relevado que o primeiro bloco do Bitcoin recebeu uma mensagem grafada, e outros arquivos já foram inseridos na rede através das ‘colored coins’ ou moedas coloridas.

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Nesta série o Bitnotícias abordará os ordinals e as moedas coloridas, os supostos NFTs da rede Bitcoin.

Fonte (os ordinals nesta página são atualizados a cada inscrição)

Ordinal

Em 2017 foi executado o soft fork com a atualização segregated witnesses (SegWit), o que permitiu que a rede Bitcoin expandisse o limite de peso do bloco de 1 milhão de Unidades de Peso (WU) para 4 milhões de WU.

Com o aumento do peso do bloco em WU, posteriormente pôde-se aumentar o tamanho do bloco de 1 megabyte (MB) para 4 MB de armazenamento.

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Desde a execução do soft fork com a atualização do Taproot, em 2021, a rede Bitcoin também passou a aceitar o armazenamento de dados e arquivos no espaço dentro dos blocos processados através do SegWit.

Criava-se ali uma forma da rede Bitcoin constituir algo ‘parecido’ com os contratos inteligentes da rede Ethereum

Estas duas atualizações permitiram que hoje diversas ‘características’ possam ser atribuídas nos registros da blockchain do Bitcoin, mais especificamente em cada satoshi.

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Todo Bitcoin é fracionado em 100 milhões de satoshis (1 satoshi = 0,00000001 BTC), e cada satoshi quando é minerado fica grafado ocupando um espaço dentro do bloco na cadeia.

Hoje, ao ser minerado, cada satoshi pode receber dados específicos, com número de série diferenciado que o transforma em um satoshi único, basicamente não fungível pelas características inseridas nele.

Esses dados serão produzidos e introduzidos numa transação por um usuário da rede Bitcoin, e serão aceitos e grafados em um único satoshi por algum minerador que selecionar aquela transação para executar dentro do bloco.

O tamanho (MB) e o peso (WU) destes dados podem ser variados, restritos às limitações máximas do bloco de 4 MB de tamanho e/ou 4 milhões de WU.

Esse satoshi não fungível, diferente dos demais porque possui alguma mensagem escrita, vídeo, imagem, documento, entre outros arquivos digitais e afins, é chamado de ordinal.

Cada ordinal pode ser enviado individualmente em uma transação, e dependendo do tamanho dos seus dados poderá ocupar a totalidade de um bloco.

Fonte

Ordinal não é NFT

Fazer a afirmação de que ordinal e NFT não é a mesma coisa pode gerar estranheza.

Mas partindo do princípio de que um NFT é um token ERC-721 ou ERC-1155 (entre outros) construído dentro da rede Ethereum, ele é um ativo dentro de milhares de projetos de NFTs dentro da blockchain.

Não apenas, assim também ocorre dentro das demais redes de blockchain que possuem contratos inteligentes capazes de gerarem NFTs.

Já um ordinal é uma parte constituinte do bloco do Bitcoin, não é um token.

Talvez a denominação mais correta para os ordinals em relação aos NFTs seria chama-los de NFS (Satoshi não fungível).

Um diferencial para justificar a terminologia é que, caso não haja nenhuma atualização relacionada ao protocolo até a mineração do último satoshi, a rede não mais produzirá ordinals.

Assim, conceitua-se que NFTs são uma classe de tokens não fungíveis dentro de uma rede que possui outros criptoativos fungíveis, como por exemplo na rede Ethereum e seus tokens ERC-20.

Já um ordinal é um satoshi não fungível diferente dos demais satoshis fungíveis dentro da blockchain do Bitcoin.

Por outro lado, existem protocolos de segunda camada conectados à rede Bitcoin que possuem a propriedade de gerar contratos inteligentes que podem gerar NFTs, além de dApps, entre outros.

A blockchain da Stacks (STX), por exemplo, está vinculada à blockchain do Bitcoin por seu mecanismo de consenso que abrange as duas cadeias, tecnologia esta denominada Proof of Transfer.

Ela permite que a Stacks compartilhe a segurança e tecnologia da rede para implementar novas usabilidades em uma camada distinta da ‘layer 1’ do Bitcoin.

Assim, desenvolvedores e usuários da rede Bitcoin podem tanto processar satoshis individuais como ativos não fungíveis, ou podem executar uma espécie de contrato inteligente capaz de gerar coleções de NFTs.

Fonte

A problemática

Para alguns estas inovações na rede Bitcoin aumentam sua usabilidade e escalabilidade.

Mas como a rede Bitcoin é formada em sua maioria por pessoas mais pragmáticas, tais mudanças desagradam.

Explorando superficialmente o lado sentimental, há a ‘eterna’ guerra dos maximalistas em banalizarem e desprezarem tudo o que não é Bitcoin.

Além disso, quando se trata de NFT já há uma legião que acha que tal tecnologia é apenas figurinha colecionável.

De fato os NFTs são muito mais que isso, mas no momento atual do mercado a primeira coisa que vem à cabeça quando se fala de NFT é a imagem de um macaco chateado.

E devido ao relativo sucesso que os ordinals estão fazendo, até porque sempre tem que haver um hype no mercado cripto, já tem até gente falando que a rede Bitcoin pode superar a rede Ethereum na produção destes ativos não fungíveis.

Delírios e sentimentalismos à parte, os ordinals mudaram algumas características na formação dos blocos e nos modelos de transações, e muitos não gostaram dos resultados.

De certa forma os desenvolvedores da rede Bitcoin nunca gostaram de muito peso nos blocos, tanto que isto inclusive já foi agravante para um fork do Bitcoin, que proveu o Bitcoin Cash.

Estima-se que os ordinals possam adicionar cerca de 200 GB de dados por ano na blockchain do Bitcoin.

Para limitar a criação dos ordinals alguns defenderam o boicote por parte dos mineradores em processarem a transação, mas elas são mediadas por taxas mais altas para incentivos aos mineradores, que fizeram com que outros vissem como benefício para a indústria de mineração.

Entretanto, isso encarece a rede como um todo, e por serem transações pesadas e terem prioridade devido aos incentivos em taxas aos mineradores podem congestionar a mempool.

De acordo com dados da Blockchair, o valor médio pago nas taxas de transação da rede Bitcoin nesta data é de US$ 1,4.

Nos últimos 30 dias esta taxa média sofreu variação de US$ 0,75 a US$ 2,25, o que em uma análise macro não apresenta nada de anormal.

Quanto ao espaço, já houve bloco minerado com apenas um ordinal, em uma transação que preencheu 99% do bloco com cerca de 4MB de espaço ocupado. Este bloco foi minerado com cerca de 60 transações, apenas.

No momento desta redação, o último bloco minerado que continha um ordinal era o bloco 777193, que possuía 3.694 transações, 1,6 WU de peso e 3,99 MB de espaço.

Com um detalhe: praticamente todos os blocos estão sendo minerados em sequência com algum ordinal.

Devido a esta situação o CEO da Blockstream, Adam Back, chegou a sugerir em sua conta do Twitter que os mineradores censurassem o que chamou de ‘porcaria’.

Depois Back apagou a postagem e se retratou dizendo que era ‘estúpido e estava sendo mal interpretado’

Inclusive comentários ou reclamações como estas acabaram virando ordinal na rede Bitcoin, entre outros textos de certa forma icônicos, como o que apresentado na imagem acima.

Pior que ainda para ajudar os céticos dos ordinals, a cunhagem do item não fungível é mais barata do que a dos NFTs da rede Ethereum, o que pode trazer cada vez mais usuários para os ordinals.

Por usar o SegWit os dados de witness, em bytes, custam 75% a menos dos que de uma transação ‘normal’ dentro da rede do Bitcoin.

Como limitação, o ordinal não é um token, é um satoshi diferenciado, e assim requer um software especial (nó de sincronização de memória) para baixá-lo, ao invés apenas de uma carteira.

Mas após isso poderá ser armazenado normalmente em uma carteira.

Fonte

Rodarmor, o criador dos ordinals

O criador do projeto ordinals deu um de Vitalik Buterin quando lançou seu satoshi colecionável.

Vitalik já disse que chegou a prever que surgiria o DeFi com a rede Ethereum, mas não que surgiriam os NFTs.

Casey Rodarmor, criador do ordinal, disse em entrevista ao TechCrunch que não tinha ideia de que o ordinal fosse fazer sucesso.

De acordo com Rodarmor, o mercado tinha uma demanda não atendida de colecionadores de NFTs que ‘expressavam o desejo’ por este tipo de ativo na rede Bitcoin.

Assim achou que estava fazendo algo bom ao lançar um projeto semelhante ao do NFT na blockchain do Bitcoin.

Rordamor, além de programador da rede Bitcoin é artista, e em 2021 viu a ascensão dos NFTs e concluiu que este era um ‘espaço em que queria mergulhar’, mesmo sendo um ‘bitcoiner hardcore que via as altcoins como desinteressantes’.

O criador do ordinal lançou o termo ‘inscrição’ (inscription) como meio de identificação dos satoshis individuais inscritos com conteúdo arbitrário na blockchain do Bitcoin.

E os chamou de ‘artefatos digitais nativos do Bitcoin’, que ‘são tão duráveis, imutáveis, seguros e descentralizados quanto o próprio Bitcoin’.

Atualmente já existem mais de 148 mil inscrições ou ordinals inscritos na rede Bitcoin, de acordo com dados o agregador de informações ordinals.com.

Isto que os ordinals foram criados no dia 14 de dezembro de 2022, portanto, já há este número de ordinals em pouco mais de dois meses de criação.

O primeiro ordinal inscrito na blockchain (Inscription 0), criado por Rordarmor, está presente no bloco de número 767430, e é a imagem de uma cabeça salva em extensão PNG, com 793 bytes de tamanho, o qual a transação custou 322 satoshis.

Fonte

Um detalhe a ser observado aqui é que este ordinal (1 satoshi) cunhado por Rordamor dentro da blockchain do Bitcoin teve custo de 322 satoshis.

Assim, caso os ordinals atinjam a mesma proporção do mercado de NFTs, fica já a curiosidade em saber quantos satoshis valerá o ‘satoshi inscription 0’ no futuro.

Outro detalhe a ser observado aqui é que Rordamor definiu os ordinals como ‘cunhados’ na blockchain, ao invés do ‘mint’, dos NFTs ‘mintados’ nas outras blockchains de contratos inteligentes.

Também cabe observar que este ordinal é uma imagem simples, sem qualquer função assim como milhões de NFTs.

(Além de imagens em diversas extensões, inclusive .GIF, já formam inscritos na rede Bitcoin ordinals de textos, vídeos, músicas, aplicações, modelos, entre outros.

Apenas no dia 09 de fevereiro foram inscritos um total de 21.824 ordinals na rede Bitcoin; um recorde.

Destes, 20.848 são imagens, 965 são textos, 9 são vídeos e 2 são áudios.

Fonte

Conclusão

Os ordinals vieram para ficar e possuem fundamentos específicos que num contexto geral são interessantes para a rede Bitcoin.

Assim como tudo o que é novo, o ordinal teve a desaprovação de uma parte da comunidade tanto por invadir o espaço da blockchain do Bitcoin, tanto por serem ‘coisas’ semelhentes aos NFTs, muito banalizados ou satirizados dentro do mercado cripto.

Entretanto, por mais que um usuário do mercado dos criptoativos não goste ou aprove um ‘NFT’ ou um arquivo grafado dentro da rede Bitcoin, os ordinais permitem uma maneira elegante, barata e 100% ‘on-chain’ de inovar dentro da rede.

Também passa a ser um novo incentivo aos mineradores que no ano próximo ano terão as recompensas de mineração cortadas pela metade com o halving.

No mais, gera a expectativa de trazer novos usuários à rede Bitcoin, assim como no futuro poderá haver inclusive plataformas ou marketplaces de ordinals da rede Bitcoin.

Por fim, cabe ressaltar novamente que os ordinals não são os primeiros dados ou arquivos a serem introduzidos no protocolo ‘mais importante’ do mercado de criptoativos.

Outras formas de se inserir arquivos diversos na rede Bitcoin já existem, mas fizeram bem menos sucesso como o Op Return e as moedas coloridas.

Na atualização do cliente Bitcoin Core no ano de 2014, feita por Antonopoulos, os desenvolvedores tornaram padrão a instrução OP Return, que gera um retorno que encerra a execução do script.

Desta forma, todo o código do script posterior a uma instrução Op Return nunca será executado podendo ser tratado como um campo de dados.

Esta atualização também permitiu a inserção de dados arbitrários em uma transação na rede.

No mais, há a opção de se marcar Bitcoins específicos com uma característica que o torna não fungível ou distinto dos demais, que são as moedas coloridas.

E este assunto, com suas raízes, fundamentos, características e curiosidades, será abordado no próximo Artigo desta série.

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Redator da Revista Bitnotícias
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