Boa tarde queridos, perdão pelo atraso, mas também sou filho de Deus 😛
No versículo anterior, o capítulo “Colecionáveis” de Shelling Out.
O “Evolução, Cooperação, e Colecionáveis” é bastante grande, então dividirei em dois versículos.
Evolução, Cooperação, e Colecionáveis
A psicologia evolucionista começa com uma descoberta matemática chave de John Maynard Smith[D89]. Usando modelos de populações de genes coevolutivos, de uma área bem desenvolvida da genética populacional, Smith postulou genes que podem codificar para estratégias, boas ou más, usadas em problemas estratégicos simples (os “jogos” da teoria dos jogos). Smith provou que esses genes, competindo para se propagarem para as gerações futuras, desenvolverão estratégias que estão no Equilíbrio de Nash para os problemas estratégicos apresentados pela competição. Esses jogos incluem o dilema do prisioneiro, um problema prototípico de cooperação, e hawk/dove, um problema prototípico de agressão e sua mitigação.
É crítico para a teoria de Smith que esses jogos estratégicos, enquanto esgotados¹ entre fenótipos aproximados, são de fato jogos entres genes no último nível – o nível de competição a ser propagada. Os genes – não necessariamente os indivíduos – influenciam o comportamento como se fossem limitadamente racionais (codificando para estratégias tão ótimas quanto possíveis, dentro dos limites do que os fenótipos podem expressar dadas as matérias-primas e história evolutiva anterior) e “egoístas” (para usar a metáfora de Richard Dawkins). Influências genéticas no comportamento são adaptações para os problemas sociais apresentado pelos genes competindo através de seus fenótipos. Smith chamou esses Equilíbrios de Nash evoluídos de estratégias evolucionárias estáveis.
Os “epiciclos” construídos sobre a teoria da seleção individual anterior, como seleção sexual e seleção de parentesco, desaparecem dentro desse modelo mais genérico em que, de uma maneira Copérnica, coloca os genes ao invés dos indivíduos no centro da teoria. Por isso, a metafórica e geralmente incompreendida expressão de Dawkins, “gene egoísta”, para descrever a teoria de Smith.
Poucas outras espécies cooperaram como os humanos Paleolíticos. Em alguns casos – o cuidado para com as crias, as colônias de formigas, cupins, e abelhas, e assim por diante, animais cooperam porque são parentes – porque podem ajudar cópias dos seus “genes egoístas” encontrados nos seus semelhantes. Em alguns casos altamente restritos, existe também cooperação entre não-semelhantes, o que os psicólogos evolucionistas chamam de altruísmo recíproco. Como descreve Dawkins[D89], a menos que uma troca de favores seja simultânea (algumas vezes até assim), uma parte ou outra pode trapacear. E geralmente o fazem. Esse é o resultado típico de um jogo que os teóricos chamam de O Dilema do Prisioneiro – se ambas partes cooperarem, as duas se saem melhores, porém se uma trapaceia, ela ganha às expensas do otário. Em uma população de trapaceiros e otários, os trapaceiros sempre ganham. No entanto, algumas vezes os animais passam a cooperar através de interações repetidas e uma estratégia chamada Tit-for-Tat (‘olho-por-olho’, ‘na mesma moeda’): comece cooperando e permaneça cooperando até que a outra parte trapaceie – daí abandone. Essa ameaça de retaliação motiva a cooperação continuada.
As situações onde tal cooperação de fato ocorre no mundo animal são altamente restritas. A limitação principal é que tal cooperação é restrita a relacionamentos onde pelo menos um dos participantes é mais ou menos forçado a estar nas proximidades do outro. O caso mais comum é quando parasitas, e hospedeiros cujos corpos eles compartilham, evoluem para simbiontes. Se os interesses dos parasita e do hospedeiro coincidem, de forma que os dois trabalhando conjuntamente seriam mais aptos do que sozinhos, (por exemplo o parasita está também fornecendo algum benefício ao hospedeiro), então, se eles conseguem jogar um jogo bem sucedido de Tit-for-Tat, eles evoluirão em simbiose – um estado onde seus interesses, e especialmente os mecanismos de saída dos genes de uma geração para a próxima, coincidem. Eles se tornam como um organismo só. Todavia, há muito mais do que cooperação acontecendo aqui – há também exploração. Elas ocorrem simultaneamente. A situação é análoga a uma instituição que os humanos teriam desenvolvido – o tributo – que analisaremos abaixo.
Alguns casos muito especiais ocorrem sem envolver parasitas e hospedeiros compartilhando o mesmo corpo e evoluindo em simbiose. Em vez disso, eles envolvem animais sem parentesco e território altamente limitado. Um exemplo proeminente que Dawkins descreve são os peixe-limpadores. Esses peixes nadam dentro e fora das bocas de seus hospedeiros, se alimentando das bactérias ali, beneficiando o peixe hospedeiro. O peixe hospedeiro poderia trapacear – ele poderia esperar o peixe-limpador terminar seu trabalho, e então comê-lo. Mas eles não o fazem. Uma vez que ambos são móveis, eles são ambos potencialmente livres para sair da relação. Porém, o peixe-limpador desenvolveu um senso muito forte de territorialidade individual, e têm listras e danças que são difíceis de imitar² – como um logotipo de marca difícil de forjar. Então o peixe hospedeiro sabe onde ir para ser limpo – e sabem que se trapacearem, eles terão de começar de novo com um peixe-limpador novo e desconfiado. Os custos de entrada, e deste modo também os custos de saída, de uma relação são altos, de maneira que funciona sem trapaça. Ademais, os peixes-limpadores são bem pequenos, então os benefícios de os comer não são grandes comparados a um número pequeno ou até uma única limpeza.
Um dos exemplos mais pertinentes é o morcego-vampiro. Como o nome sugere, são animais que sugam o sangue de presas mamíferas. O interessante é que, em uma noite boa, eles trazem um excedente; em uma noite ruim, nada. Seus negócios sombrios são altamente imprevisíveis. Como resultado, os morcegos sortudos (ou habilidosos) frequentemente compartilham sangue com os morcegos menos sortudos (ou habilidosos) em sua caverna. Eles vomitam o sangue e o grato beneficiário come.
A vasta maioria desses beneficiários são familiares. De 110 dessas regurgitações testemunhadas pelo biólogo de estômago forte G.S. Wilkinson, 77 eram casos de mães alimentando suas crianças, e a maioria dos outros casos também envolviam parentesco genético. Havia, porém, um pequeno número que não poderia ser explicado por altruísmo familiar. Para demonstrar que esses eram casos de altruísmo recíproco, Wilkinson combinou as populações de morcegos de dois grupos diferentes. Os morcegos, com raras exceções, alimentavam somente amigos antigos do grupo original.[D89] Tal cooperação requer a construção de uma relação de longo prazo, ondes os parceiros interagem frequentemente, reconhecem um ao outro, e acompanham o comportamento uns dos outros. A caverna de morcegos ajuda a restringi-los a uma relação de longo prazo onde tais ligações podem se formar.
Veremos que alguns humanos, também, escolheram presas arriscadas e descontínuas, e compartilharam o excedente resultante com não-familiares. Na verdade, eles realizaram isso em uma extensão muito maior do que o morcego vampiro. Como o fizeram é o assunto principal de nosso artigo³. Dawkins sugere, “o dinheiro é um token formal de altruísmo recíproco atrasado”, mas não persegue essa ideia fascinante mais além. Nós iremos.
¹ played out: esgotado. Pode significar ‘jogado’, e embora o contexto sugira essa tradução, acredito que o autor se refira a “esgotar” de tanto “jogar”.
² spoof: enganar, forjar, imitar, fraudar.
³ essay: dissertação, ensaio, redação, artigo.
Esse foi o terceiro versículo, no próximo a segunda parte de “Evolução, Cooperação, e Colecionáveis”.
Fiquem com o pai e até amanhã..