Suas transações financeiras dizem muito sobre onde você esteve e o que estava fazendo – sendo assim, uma maneira perfeita de vigiá-lo.
Esta foi uma ótima razão que levou Alex Gladstein, diretor de estratégia da Human Rights Foundation e professor da Singularity University, a se interessar pelo uso do Bitcoin na luta pelos direitos humanos.
“Aprender sobre Bitcoin me deixou mais curioso como o dinheiro é criado, quem decide quando o pagamento é realizado”, disse ele no podcast, Unchained. “Esse é um bom exemplo de por que algo como Bitcoin é importante. Porque, no final do dia, é uma plataforma de pagamento neutra. Ninguém pode decidir se uma pessoa pode receber ou enviar dinheiro. Em uma época do crescimento da vigilância, isso se tornará cada vez mais importante.”, disse Gladstein.
Um protesto contra Governos
Para pessoas que vivem sob governos autoritários, o Bitcoin pode ser uma ferramenta financeira valiosa como meio de troca resistente à censura. Os venezuelanos, por exemplo, vivem sob autoritarismo e não têm como reformar as políticas que destruíram sua economia. Eles não podem responsabilizar seus governantes através de eleições livres e justas ou fazer campanha por mudanças sem medo de represálias.
Mais de 3 milhões de venezuelanos fugiram desde 2014 e 5.500 saem para sempre todos os dias. Segundo as Nações Unidas, o êxodo está “na escala da Síria” e agora é uma das piores crises de refugiados do mundo. À medida que os venezuelanos escapam, eles partem com quase nada, desesperados e vulneráveis.
Neste caso, a inovação veio como salvação. Hoje, os venezuelanos estão adotando e experimentando o Bitcoin para evitar a hiperinflação e rígidos controles financeiros. A censura do governo não é possível, pois a criptomoeda não é roteada por um banco ou por um terceiro e, em vez disso, chega diretamente à carteira de modo peer-to-peer, sem intervenção de terceiros.
A Venezuela não é o único lugar onde as pessoas podem usar o Bitcoin como uma válvula de escape. No Zimbábue, Robert Mugabe imprimiu quantidades infinitas de dinheiro e transformou a economia de seus cidadãos em nada, mas seus sucessores não poderão imprimir mais Bitcoins. Na China, Xi Jinping pode rastrear todas as suas transações no Alipay e no WePay, mas ele não pode orquestrar a vigilância em massa de todos os pagamentos em Bitcoin. Na Rússia, Vladimir Putin pode congelar sua conta bancária, mas ele não pode congelar sua carteira de Bitcoin. Em um campo de refugiados, talvez você não consiga acessar um banco, mas enquanto encontrar uma conexão com a internet, poderá receber Bitcoin sem pedir permissão e sem ter que provar sua identidade.
O poder do Bitcoin
Quando você paga a alguém com software como o Venmo nos EUA ou PicPay no Brasil, pode usar três ou quatro intermediários financeiros, mesmo que o destinatário esteja na sua frente. Cada intermediário pode, potencialmente, censurar, vigiar e lucrar. E os bilhões de seres humanos que vivem sob regimes repressivos não podem esperar que a maioria dos softwares de pagamento no futuro permaneça tão inocente ou benevolente quanto o Venmo ou PicPay. Como Nassim Nicholas Taleb escreveu, o Bitcoin é “uma apólice de seguro contra um futuro Orwelliano”.
Gladstein, observando que a opção de dinheiro em papel e moeda pode não estar disponível em cinco anos, explica que é por isso que é tão importante desenvolver o dinheiro digital. Ele diz que as três razões pelas quais o Bitcoin é tão poderoso são: que é deflacionário, o que impede o governo de imprimir mais e degradar o valor; resistente à censura, para que o governo não possa interromper uma transação e você pode usá-lo sem um documento de identidade ou passaporte.
Ele observa que essas qualidades são o que torna o Bitcoin útil para ativistas, e que mesmo em países como Nigéria, Filipinas, China, Venezuela ou Irã, é possível, alguns minutos depois de receber o Bitcoin, trocá-lo para a moeda local.
Para esse fim, a HRF está buscando quatro canais para ajudar ativistas de direitos humanos a usar o Bitcoin em seu trabalho. Primeiro, eles estão ajudando a realizar pesquisas para que as ferramentas possam ser melhor projetadas para esse tipo de trabalho. Segundo, eles estão trabalhando para educar outras pessoas sobre a tecnologia. Terceiro, eles estão tentando diversificar o desenvolvimento do núcleo e ajudar mais pessoas a serem educadas na programação da tecnologia Bitcoin e blockchain. E quarto, eles estão educando os ativistas sobre como eles podem usar essas tecnologias de maneira segura.
Menos de 1% da população do mundo – não mais de 40 milhões de pessoas – já usou Bitcoin. Mas, de acordo com a Human Rights Foundation, mais de 50% da população mundial vive sob um regime autoritário. Se investirmos tempo e recursos para desenvolver carteiras fáceis de usar e melhores materiais educacionais para o Bitcoin, ele tem o potencial de fazer uma diferença real para os 4 bilhões de pessoas que não podem confiar em seus governantes ou que não podem acessar o sistema bancário. Para eles, o Bitcoin pode ser uma saída.